Duas roubalheiras e uma bandalheira


Há figuras gradas do PSD associadas à roubalheira do caso BPN e figuras gradas do PS ligadas à bandalheira que o consentiu. O campeonato das figuras gradas, neste e noutros assuntos, está mais ou menos empatado

Pode o caso BPN ser definido como uma ‘roubalheira’? Pode. Mas pode ser definido dessa forma por alguém que não Imagem816esteja ao volante de um táxi? Pelos vistos, sim. Que se tratou de uma roubalheira, ninguém parece ter dúvidas. Mas (algo inexplicavelmente, aliás), as pessoas continuam a esperar de um político que possua a virtude da elegância, e foi por isso que as declarações de Vital Moreira causaram algum tumulto. Uma expressão de sabor arcaico, como ‘uma indecorosa falperra’, talvez provocasse menos polémica. Uma ‘imunda mamata’, mesmo tendo em conta a sua pujança aliterativa, teria sido, provavelmente, mais bem tolerada. ‘Uma rapinagem indecente’, não sendo uma enunciação menos violenta, ter-se-ia aceitado melhor. O grande problema da escolha de palavras de Vital Moreira é a apropriação, pelo discurso político, do léxico próprio do discurso popular. Se candidatos a cargos públicos começam a destratar-se com o vocabulário do povo, que sobra aos cidadãos para a saudável manifestação de desdém pelos seus representantes? Estamos, evidentemente, perante uma outra roubalheira, esta de ordem lexical. Se, nos próximos dias, Vital Moreira acusar Paulo Rangel de se candidatar ao parlamento europeu com o único propósito de ‘ir para o poleiro’, poderemos mergulhar na maior crise vocabular que o país viveu desde que Pinheiro de Azevedo disse que estava farto de brincadeiras e que o chateava ser sequestrado.

O violento ataque de Vital Moreira às regras tácitas da linguagem só encontra paralelo no violento ataque de Vital Moreira às regras tácitas da sã convivência política. Quando relacionou ‘figuras gradas do PSD’ com a roubalheira do BPN violou um princípio fundamental e bonito: PS e PSD podem acusar-se mutuamente de minudências, mas devem conter-se no que toca aos assuntos importantes. O PSD não traz para a campanha o envolvimento de figuras gradas do PS no caso Freeport e o PS não chama à colação as figuras gradas do PSD atingidas pelo caso BPN. Ambos os partidos desejam ardentemente que os casos sejam investigados, mas estranham que estejam a ser investigados ‘nesta altura’. É um escândalo que a investigação seja feita e publicitada em períodos políticos sensíveis, e não naqueles dez minutos por ano em que não há campanha eleitoral autárquica, nem europeia, nem legislativa.

Por outro lado, Vital Moreira foi duro na caracterização da roubalheira, mas não foi tão rigoroso na contabilização das figuras gradas. Há figuras gradas do PSD associadas à roubalheira do caso BPN e figuras gradas do PS ligadas à bandalheira que o consentiu. O campeonato das figuras gradas, neste e noutros assuntos, está mais ou menos empatado.

Ricardo Araújo Pereira in Visão

Um pensamento em “Duas roubalheiras e uma bandalheira”

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