Tribunal Administrativo de Coimbra dá razão a queixa do SPRC/Fenprof.


O Ministério da Educação foi condenado, por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra (TAFC) e obrigado a abster-se de informar os Presidentes dos Conselhos Executivos (PCE) das escolas e agrupamentos que estes poderão, tendo em conta as situações concretas das suas escolas, fixar [ou não] os objectivos individuais (OI) de avaliação dos docentes que os não tenham entregado. Ou seja, tendo sido decretada definitivamente esta providência cautelar, fica ultrapassada a possibilidade de serem criadas situações de desigualdade, decorrentes de decisões tomadas de forma arbitrária, que permitiam que alguns PCE’s recusassem avaliar os docentes por estes não terem proposto os seus OI. Seguir-se-á, agora, a interposição, junto do mesmo Tribunal, da acção administrativa especial.

Para a FENPROF, as razões que levaram à interposição desta providência cautelar sobre as orientações da DGRHE/ME, nomeadamente as datadas de 09/02/2009, foram acolhidas pelo TAFC que não autoriza o ME a manter este tipo de orientação passível de ferir o princípio da igualdade consagrado na Constituição da República Portuguesa.

Para a FENPROF, fica, desta forma, desfeita a dúvida quanto à possibilidade de, em algumas escolas, os professores que não entregaram a sua proposta de OI não serem avaliados pelo simples facto de, os respectivos PCE’s, alegarem indefinidas “situações concretas das suas escolas”. Parece, também, caírem por terra as ameaças do ME, quanto a eventuais penalizações desses professores. Ameaças que, contudo, têm sido feitas à margem de qualquer fundamentação legal, como, recentemente, confirmaram os membros da equipa ministerial na sua deslocação à Assembleia da República.

A história

Salários dos gestores: A crise não é para todos

O número é gordo: 810 891 euros. Foi este o salário médio que cada administrador executivo, de dez das maiores empresas portuguesas cotadas em bolsa, ganhou ao longo de 2008. Um rendimento 136 vezes superior ao de uma pessoa que tivesse auferido o salário mínimo em vigor durante o mesmo ano. Veja as contas: 14 meses x 426,5 euros = 5 971 euros. E um português que ganhe um salário médio estimado em torno dos mil euros necessitaria de duas vidas para conseguir um rendimento igual ao que um daqueles gestores aufere num ano.

Mesmo assim, este valor ficou abaixo dos 861 958 euros que os mesmos executivos receberam, em média, em 2007. Uma descida que parece ir ao encontro do que tem sido um dos temas mais mediáticos de toda a actual crise: a moderação dos níveis salariais dos gestores de topo das grandes empresas.

Ainda recentemente, numa reunião dos ministros das Finanças da Zona Euro, foi admitido existirem salários “escandalosos”, em empresas da União Europeia.

O ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, disse estar “preocupado com a dimensão desproporcionada” dos salários dos gestores e também apelou à moderação dos salários dos altos quadros das empresas.

O presidente do BPI, Fernando Ulrich, por seu turno, considerou que defender o limite dos salários dos gestores é “politiquice barata e reles”. Mas o banco por si liderado, o BPI, baixou o rendimento da sua comissão executiva, Ulrich incluído, em 41% de 2007 para 2008.

E o que podem os governos fazer além de lançarem apelos? Muito pouco. A solução pode estar na via fiscal. Salários desta grandeza são tributados à taxa máxima de IRS, de 42 por cento. “No máximo, o que o Governo pode fazer é criar um imposto especial para indivíduos que ganhem mais que um determinado montante”, esclarece Diogo Leite Campos. O fiscalista faz questão de esclarecer, contudo, que tal medida apenas seria aplicada aos rendimentos futuros, pois a lei fiscal, sublinha, “não é retroactiva”.

O problema não é de agora, apenas ganhou maiores proporções devido à crise e à injecção de dinheiro que os Estados, um pouco por todo o mundo, estão a fazer nas empresas.

Mas como é que tantos gestores conseguiram atingir tais patamares de rendimento? A resposta óbvia seria algo do género: “São uma consequência natural do capitalismo.” Mário Parra da Silva, presidente da Associação Portuguesa de Ética Empresarial, tem uma visão diferente. “O que aconteceu é que foram atraiçoados alguns dos princípios básicos do capitalismo, um modelo que se baseia na propriedade e não na gestão.” O capitalismo, acrescenta, assenta, ainda, na “ideia de que quem gere mal a sua empresa, arrisca-se a perder o seu património “. Era assim quando os gestores eram os donos do capital. Entretanto, tudo mudou.

Segundo Mário Parra da Silva, assistimos a uma tomada de posição de poder dentro das corporações: “O jogo tornou-se perverso.

As empresas passaram a ser controladas por pessoas que, na verdade, não as possuem.

O princípio de que o capitalista tem de correr o risco de perder o seu património foi deturpado. De uma lógica de preservação de património para as gerações futuras, passou-se a uma lógica de rendimento mais alto possível e mais depressa possível.” Por outras palavras, ganhar o máximo hoje, sem olhar para o amanhã.

O paradigma deste tipo de capitalismo “deturpado” é o gigante segurador AIG. À beira da falência, a empresa foi alvo de uma injecção de dinheiros públicos 173 milhões de dólares, no âmbito do programa de apoio ao relançamento da economia, nos EUA. E o que é que a gestão da companhia fez, alguns meses mais tarde, com esses montantes? Autocompensou-se. A cúpula directiva da AIG atribuiu a si própria um bolo salarial no valor de 165 milhões de dólares.

Ou seja, em vez de servirem para endireitar as contas da AIG, os dinheiros dos contribuintes premiaram os responsáveis pelo descalabro da seguradora.

O caso chocou a opinião pública e obrigou à intervenção directa do Presidente dos EUA, Barack Obama, que acabou por cobrar em impostos parte dos salários que estes executivos tinham recebido.

OS CASOS PORTUGUESES

Por cá, durante a apresentação das contas de 2008, entre Março e Abril, empresas como a Sonae, Millenniumbcp, Banco Espírito Santo, Impresa, entre outras, anunciaram uma redução ou congelamento dos pagamentos aos altos quadros, medidas que estarão em vigor em 2009, independentemente da dimensão ou desempenho empresarial da empresa.

No entanto, apesar da diminuição de alguns dos rendimentos dos gestores de topo, esta não foi regra única para os salários de 2008. Num grupo de dez grandes grupos analisados pela VISÃO, apenas quatro optaram por baixar os salários dos executivos. A Portugal Telecom foi a empresa onde se registou uma maior descida. No entanto, em 2007 os seus gestores beneficiaram de um pagamento extraordinário, no valor de 4,9 milhões de euros, atribuídos a título de rendimento variável. Foi o prémio por terem conseguido cerrar fileiras e bloquer a OPA lançada pela Sonae. E este acréscimo extraordinário, em 2007, é, também, uma das principais razões da queda, igualmente extraordinária, registada em 2008, dos salários de topo, naquela empresa.

Contas feitas, o ordenado médio dos administradores executivos da PT 890 mil euros por ano mantém-se acima da média das restantes grandes empresas nacionais por nós analisadas.

Onde os salários vêm registando uma acentuada derrapagem, mais em linha com os resultados e a cotação bolsista, é no Millenniumbcp.

Quando a equipa de Carlos Santos Ferreira iniciou uma nova era na gestão daquele que é o maior banco privado português criado após o 25 de Abril, as políticas salariais da cúpula de gestão sofreram uma mudança brusca. Um corte radical com o passado da instituição Santos Ferreira foi o primeiro presidente do banco não escolhido ou aceite pelo fundador do Millenniumbcp, Jorge Jardim Gonçalves.

Em 2007 e 2008, os administradores não receberam qualquer rendimento variável.

Esta foi, aliás, a única empresa em análise cujos gestores apenas levaram para casa o rendimento fixo. Em média, os sete admi- nistradores do banco receberam 487 mil euros por ano, quase metade da média do que pagaram as outras empresas. O salário de 2008 também levou um significativo corte em relação ao do ano anterior: menos 27,5 por cento.

No BPI, a política de vencimentos não é muito diferente. Em 2008, cada um dos elementos da equipa de Fernando Ulrich recebeu, em média, 526 mil euros, um montante em que estão incluídos o salário fixo e os prémios de gestão.

ELECTRIZANTE

Já no Banco Espírito Santo a política é outra. A comissão executiva, composta por 11 elementos, recebeu 12,6 milhões de euros, o que equivale a um salário médio superior a um milhão de euros anual para cada gestor.

Mas o recorde das subidas de salários entre 2007 e 2008 pertenceu à Rede Eléctrica Nacional REN. Os gestores desta empresa liderada por José Penedos viram o seu ordenado aumentar 157%, de um ano para o outro. Uma subida impressionante, em tempo de crise. Além do mais, a empresa nem apresentou um desempenho melhor que no ano anterior, pois os lucros baixaram 12,3 por cento. É importante, todavia, fazer uma ressalva: apesar da subida vertiginosa, a média salarial, que é, aqui, de 656 mil euros/ano, continua muito abaixo da média das restantes empresas analisadas pela VISÃO.

A justificação para tão significativos aumentos pode ler-se nos relatórios do governo societário da REN. Verifica-se que, em 2007, a componente do rendimento variável destes gestores foi praticamente inexistente: 7 mil euros para cinco pessoas.

O rendimento fixo ascendeu, nesse ano, a 1,27 milhões de euros. E em 2008, a componente fixa aumentou para 1,87 milhões, o que equivale a um aumento de 47 por cento.

Além disso, a componente variável também foi substancialmente insuflada, passando para 1,4 milhões de euros.

Nos mesmos relatórios, a administração lembra que, deste total, 430 mil euros foram recebidos por administradores de sociedades participadas. Mesmo assim, se retirarmos essa verba, o aumento das remunerações continua a ser de mais de três dígitos: qualquer coisa como 122 por cento.

ACIMA DO MILHÃO

Falámos, até agora, de salários médios das cúpulas directivas. Não sabemos quanto ganhou Ricardo Salgado, nem Santos Ferreira, nem José Penedos em particular. Na EDP, pelo contrário, a transparência chega aí, ao salário do presidente da comissão executiva. António Mexia defende que “os ordenados têm de ser transparentes”.

E, de facto, é dos poucos gestores que revela o seu salário. Em 2008, recebeu 686 mil euros de rendimento fixo, exactamente o mesmo que em 2007, e 570 mil de rendimento variável, menos 30 mil euros que no ano anterior. Ou seja, um total de 1,256 milhões de euros. Os restantes seis administradores executivos encaixaram 6,4 milhões, quase 1,1 milhões por cabeça, em média mais 50 mil euros/cada que em 2007. O ano passado foi de crise, os salários aumentaram (salvo o do presidente que até perdeu 30 mil euros) mas os lucros da EDP cresceram mais de 20 por cento.

Paulo Azevedo, o novo “patrão” do grupo Sonae, também não tem problemas em divulgar, no relatório do governo da sociedade, os seus rendimentos. O filho de Belmiro de Azevedo, que tomou as rédeas da empresa em 2007, recebeu, em 2008, 1,06 milhões de euros, menos 9,4% do que os 1,17 milhões recebidos em 2007. Mas os outros três administradores executivos da Sonae SGPS auferiram, em média, mais de 850 mil euros.

Paulo Azevedo garantiu à VISÃO que a Sonae “tem uma política salarial muito ligada ao mercado, mas goza da reputação de ser menos dada a grandes salários que o mercado em geral”.

Quanto à descida dos salários dos gestores e à possibilidade de eles diminuírem no grupo Sonae, o líder do grupo esclarece que “se o mercado baixar muito, nós também baixaremos, mas não creio que isso aconteça.

Eu próprio tenho um prémio inferior ao do ano passado, mas isso tem a ver com a performance das empresas. A parte variável, no que se refere aos gestores, tem um peso muito grande, e muito acima do peso do mercado.

Se há menos negócio, há menos salário”.

Mas estes dois casos de divulgação dos salários são das poucas excepções que confirmam a regra. Apesar das recomendações da Comissão do Mercado dos Valores Mobiliários de maior transparência nos salários dos gestores, a grande maioria das empresas apresenta apenas de forma agregada os rendimentos da equipa de gestão.

Diogo Leite Campos diz que esta prática não é da maior transparência, pois “alguns ganham o dobro dos outros e esse valor nunca é divulgado”. Além disso, realça o facto de existir outro tipo de prémios, em espécie, que não são mencionados no relatório de governo das sociedades, “um documento onde estas práticas deveriam ser relatadas”.

Visão

Ana Drago denuncia abuso e intimidações do Ministério da Educação

A declaração política do Bloco esta semana foi dedicada aos recentes episódios de intimidação e abuso do Ministério da Educação nas escolas. A deputada Ana Drago falou da destituição do Conselho Executivo da Escola de Santo Onofre, da tentativa de incriminação dos professores de Fafe como sendo os mentores do protesto dos estudantes e do uso abusivo de imagem das crianças da Escola de Castelo de Vide num tempo de antena do PS.

Bloco anuncia “segundo passo” nas propostas contra a corrupção




29-Abr-2009

Jornadas parlamentares do Bloco aprovam propostas para combater enriquecimento ilítico e corrupção. Foto guano/FlickrDepois da aprovação do levantamento do sigilo bancário, do fim “pára-quedas dourados” e da transparência nos salários dos gestores, as jornadas parlamentares do Bloco apresentaram novas medidas anti-corrupção. Louçã diz que “Portugal não é um país de corruptos mas há uma enorme corrupção que nunca foi combatida” e apresentou quatro projectos de lei para o debate na Assembleia.

“Hoje tornamos público o segundo passo neste combate, constituído por quatro propostas que vamos apresentar ainda nesta sessão legislativa ao Parlamento”, disse o dirigente bloquista no fim das jornadas parlamentares realizadas no distrito de Braga. “Não existe uma grande corrupção e uma corrupçãozinha”, prosseguiu Louçã para justificar a primeira proposta, que defende penas de prisão iguais para os crimes de corrupção para acto lícito e ilícito. Se a proposta for aprovada, o resultado das condenações será entre um a oito anos de prisão, agravada de dois a oito anos quando aplicada a titulares de cargos públicos.

Para fazer frente ao enriquecimento injustificado, a proposta do Bloco aplica-se a quem tenha rendimentos superiores a 25 mil euros anuais e seja verificada uma discrepância de 20% entre o rendimento declarado e o rendimento real. Caso não consiga explicar de onde vem o dinheiro a mais, ele reverterá a 100% para o Estado, podendo ainda ser notificado o Ministério Público sempre que haja suspeitas de crime. “Não aceitamos o ponto de vista do Governo de que quando não houver nenhuma justificação para aquele rendimento o contribuinte deve pagar uma taxa de 60 por cento. Deixá-lo com 40 por cento de uma verba que ele não consegue justificar seria um incentivo ao enriquecimento ilícito”, afirmou Louçã.

A terceira proposta diz respeito às mais-valias urbanísticas resultantes da venda de património valorizado por um acto administrativo “a pedido”, que deverão igualmente reverter para o Estado, “como acontece em vários países europeus, nomeadamente Espanha”, referiu Louçã. O caso de especulação imobiliária escolhido para ilustrar a terceira proposta bloquista foi um negócio em Gondomar. “Uma senhora vendeu por um milhão de euros a Quinta do Ambrósio a familiares de Valentim Loureiro, que seis dias depois a venderam por quatro milhões. Pouco tempo depois, aquele terreno tornou-se edificável”, explicou Louçã, garantindo que se esta lei já existisse, a mais-valia iria totalmente para os cofres do Estado. “Com esta medida garante-se que o proprietário do terreno recebe um valor justo pela sua venda mas que não haverá especulação urbanística”, disse o deputado do Bloco.

O enriquecimento ilícito de titulares de cargos políticos e funcionários públicos também está na mira do Bloco. A quarta proposta a apresentar à Assembleia da República prevê que nos casos em que exista uma variação patrimonial significativa durante o desempenho de um cargo, ou nos cinco anos seguintes, deverá ser investigado pelo Ministério Público, a quem competirá provar o eventual crime.

A época da velhacaria

Vinte e duas empresas foram objecto de processos-crime por falência fraudulenta. Só vinte e duas?, perguntará o leitor, movido por indignada curiosidade. Lembremo-nos, apenas, daquele cavalheiro, um dos homens mais ricos de Portugal, que, há não muitas semanas, resolveu pôr, no olho da rua, quase cento e cinquenta trabalhadores, “como medida de prevenção”. Um acto desta natureza releva de repugnante indignidade. O sujeito em questão não foi incomodado, sabendo-se, embora, da falácia do despedimento.

Aliás, a nova lei do trabalho está cheia de iniquidades, resguardadas com a “letra” e respaldadas no que se designa de “protecção dos trabalhadores”. A hipocrisia, com a chancela deste Governo, foi veementemente aplaudida pelo patronato, o qual, para armar aos cardos, disse, em uníssono, que era ainda necessário proceder a umas “pequenas alterações”. A velhacaria aumenta de volume.

Vivemos neste universo de canalhice e num inferno social e político. Há dias, um dos preopinantes desse extraordinário programa “Quadratura do Círculo” ficou ofendido quando percebeu ser ali dito que a Direita não era favorável à igualdade social. A criatura, conhecida pelos dislates que comete, pelas tolices que formula, e pelas extravagantes fatiotas que enverga, é um daqueles casos de estudo que o falhanço do 25 de Abril conduziu ao plinto da notoriedade.

A Direita foi e é o que é. O Marcelo Rebelo de Sousa, há anos, ferrou-a com uma frase conclusiva: “A Direita portuguesa é a mais estúpida da Europa”. Em relação ao preopinante referido, não sou eu quem vai desdizer o professor. E adianto: a Direita não é só arrogante, com escassas meninges e cabeça de alfinete como se julga dever deter o poder por graça divina. Dir-me-ão: nem toda a gente de Direita é aquilo que você diz. Nem toda a gente, é verdade. Porém, tenho dificuldade em descobrir mais do que se conta pelos dedos de duas mãos abertas. Depois, há sempre uma certa dificuldade em discutir ideias, livros, filmes, peças de teatro, artes. A barafunda, aí, atinge a esquizofrenia.

Um velho amigo do PSD, repito, para não haver engano: um velho amigo do PSD dizia-me, num dos almoços regulares em que nos encontramos: “A Direita portuguesa não dispõe de património intelectual, nem o martirológio da Esquerda, que é, também, uma grandiosa herança moral”. Talvez assim seja, talvez. A verdade é que, a propósito do 25 de Abril, avisaram-me de que os blogues direitões encheram-se de insultos ao Zeca Afonso, de ameaças aos capitães da Revolução e de vivas a Salazar. Não é importante. Nem sequer é significativo. Todos os cobardes acolhem-se no anonimato, e insultar um homem e um artista da dimensão do Zeca Afonso passa a ser um espinoteante tolejo.

O facto de o norueguês Knut Hamsun ter sido traidor à pátria; de Brasillach e Drieu La Rochelle e Lucien Rebatet e Céline possuírem estofos de canalhas, não invalida nem sequer diminui os seus estatutos de grandes escritores. Aliás, grosso modo, é a Esquerda (muitíssimo mais generosa) que tem promovido a glória daqueles e de outros assim. A minha fama de sarrafeiro é injusta, embora não me aqueça nem arrefeça. Levo muitos anos de prosa afiada, e se ter carácter implica obus, pago o preço. Não sou nem mais nem menos do que aqueles (infelizmente, hoje, muito escassos) que, movidos pela indignação, surgem aos olhos dos medrosos como “comunistas imprecadores”, insólita definição de que tive divertido conhecimento. Pessoalmente, quando entendo que a razão me alimenta, pego no estadulho e vou a terreiro. É só.

Se analisarmos, modesta e levemente que seja, o cenário da Direita, verificamos que, entre ela, o entendimento também é dissonante. A Esquerda não se entende, fenómeno histórico decorrente das pequenas lutas pelas hegemonias. Mas a Direita entredevora-se. Observe-se o PSD e os seus tenores. Os ódios enredam-se numa teia que atinge os territórios do assassínio cívico. Aqueles que, durante os últimos anos, ocuparam lugares chorudos e empregos sumptuários, deixam, com dificuldade, os cargos aos que chegam. Esta saca de escorpiões é de tal ordem e de tamanha voracidade, que Sá Carneiro chegou a dizer: “Esta gente é do pior que habita Portugal”. E deixou o partido a outros.

O PSD de hoje, quase desfeito, sem rumo nem projecto, é a imagem devolvida do que sempre foi. Possuía uma zona de interesses, presumivelmente imóvel, com os vampiros que se substituíam uns aos outros, com insistente zelo e registo. Veio o PS do «socialismo moderno» (quer dizer: sem freio e sem vergonha) e ocupou-lhe o lugar. O descalabro aí está. E ambos os partidos representam as ruínas prévias de uma indignidade abjecta.

Que nos resta? O voto? Apesar de tudo, ainda acredito no poder do voto. Mas também acredito na omnipresença dos grandes manipuladores, na existência de jornalistas venais, e num povo indefeso e desgraçado.

Baptista Bastos no J.Neg.

Cartão do cidadão pode falhar eleições

Documento dos registos e notariado exige a identificação no número de eleitor. Os serviços garantem que esta informação consta do ‘chip’ do cartão do cidadão. Ministério da Administração Interna diz o contrário. Comissão Nacional de Protecção de Dados afirma que o diploma em vigor não abrange o cartão de eleitor. Um mar de contradições em ano de eleições.

O Governo apresentou o cartão de cidadão (CC) como um smart card substituto dos actuais bilhete de identidade, cartão do contribuinte, cartão de beneficiário da Segurança Social, cartão de utente dos serviços de saúde e… cartão de eleitor. E é precisamente o número de eleitor que levanta confusão e dúvidas legais num ano com três actos eleitorais.

O diploma que criou o CC, a Lei n.º 7/2007, de 5 de Fevereiro, não contempla o “número de eleitor” no pacote das referências visíveis ou no circuito integrado (chip). O que significa que não há suporte jurídico para esta exigência. Contudo, esse dado está a ser obrigatoriamente solicitado pelos serviços e consta do impresso do Instituto dos Registos e do Notariado (IRN), um facto de confirmação rápida. Basta ter acesso a um documento comprovativo do pedido e do pagamento de 12 euros. Existem cinco campos: dados biográficos (inclui BI), finanças, Segurança Social, saúde e eleitor.

No portal do CC pode ler-se que, do ponto de vista visual, o cartão exibirá, na frente, a fotografia e os elementos de identificação civil. No verso, terá os números de identificação dos diferentes organismos cujos cartões agregados e substitui, uma zona de leitura óptica e o chip”. Só que nos cartões que “agrega” a lei não contempla o cartão de eleitor. Contactada a Comissão Nacional de Protecção de Dados, Clara Guerra citou a legislação em vigor.

“Não há absolutamente nenhuma indicação na Lei do Cartão de Cidadão que faça qualquer referência nem ao número de cartão de eleitor quer seja visível ou não (chip)”, reiterou ao DN.

Através do número de telefone 707200886 foi colocada a questão por duas vezes. Ou seja, pode-se ou não votar com o cartão do cidadão? Para a mesmo pergunta, duas respostas. “Pode votar. O número de eleitor não consta do cartão fisicamente mas está no chip do cartão”; “pode levar o Cartão de Cidadão para se identificar mas não pode ainda votar com o cartão porque ainda não existe voto electrónico em Portugal. O número não é visível mas já consta do próprio chip. Como não existem ainda as máquinas próprias para o voto electrónico ainda não é possível votar com o Cartão de Cidadão”, disse. Esta informação contraria as declarações do Ministério da Administração Interna.

De acordo com um e-mail enviado ao DN pelo assessor de Imprensa, Manuel Lage, este garante que “o número de eleitor não consta do chip do cartão de cidadão sendo automaticamente atribuído quando o CC é levantado pela DGAI (Direcção-Geral da Administração Interna) através do Sistema de Informação e Gestão do Recenseamento Eleitoral (SIGRE)”. Por outro lado, a DGAI considera que “o cartão de eleitor não é legalmente necessário para votar”.

Para a CNE falar em Cartão de Cidadão e Cartão de Eleitor são duas coisas distintas. “Actualmente o cartão de cidadão não tem o número de eleitor e as pessoas continuam a apresentar o seu cartão de eleitor antigo ou vão à Junta de Freguesia. Não faço a mínima ideia se está ou não no chip, até porque este exige um dispositivo necessário de leitura. Julgo que foi por causa disso que foi decidido não incluir o cartão de eleitor nos cartões de cidadão”, disse ao DN Nuno Matos. Só que as dúvidas em relação ao cidadão continuam.

As próprias juntas de freguesia quanto abordados sobre esta questão alegam que “não sabem de nada”. Nas serviços de registo e notariado, incluindo Lojas do Cidadão, a situação é a mesma.

“Não sabemos se as mesas de voto terão ou não as tais máquinas para lerem o chip mas vai receber uma informação da DGAI da sua mesa de voto caso tenha, entretanto, pedido o seu CC. Fale com a junta de freguesia ou então venha cá ou telefone que nós vamos ao programa e damos-lhe o número de eleitor porque que nós essa informação. Mas ainda não se sabe de nada das eleições. Os dados ficam no chip. Mas nestas primeiras eleições ainda vai votar com o cartão de eleitor. Para as próximas eleições será com o cartão de cidadão pois entretanto as entidades devem adquirir a máquina para poder ler”, disse ao DN uma colaborada do IRN.

De acordo com dados disponíveis pela Deco, o cartão do cidadão está disponível em todos os distritos, cidade de Lisboa e regiões autónomas. Os cidadãos que precisem de alterar dados ou renovar documentos de identificação podem recorrer a qualquer posto no País, sendo que mais de 235 mil portugueses têm o cartão de cidadão, emitido por mais de três centenas de postos de atendimento.

D.N.

Sem novidades de cá

A RTP1 resolveu, anteontem, “pensar Portugal”. É uma ideia comovente, tanto mais que o maciço conceito que lhe subjaz seria sugestivo, acaso, no nosso país, alguém pensasse no País. A política, aliás, porque de política se tratou, no programa de Fátima Campos Ferreira -, a política é uma actividade que sempre foi dirigida a um restrito número de homens. Nada de novo foi dito. Todos sabemos o lodaçal em que vamos sobrevivendo mas, ao que parece, ninguém sabe como nos vamos libertar.

Foram repisados, com maior ou menor veemência, os problemas sufocantes, que estão a corroer o frágil edifício democrático português. E deveria, talvez, ser dito que a “importação da crise” resulta da natureza escabrosa do sistema, e de que a esquerda não encontrou, até agora, resposta para a superar, criando alternativas às que têm vigorado. A esquerda, essa que se diz “livre e democrática”, não tem sido mais do que cúmplice e esteio do mais feroz capitalismo.

A “credibilização das instituições”, expressão utilizada por um dos convidados de Fátima Campos Ferreira, perdeu qualquer espécie de sentido. Há 30 anos que desfilam as mesmas caras, se ouvem as mesmas vozes, se lêem as mesmas frases com monótona aridez. O País é domado por um grupo sem prestígio mas com poder. Esperávamos um sistema, emergiu um domínio. A erupção do “bloco central de interesses” (ou seja: a divisão do bolo entre PS e PSD) assinala a degenerescência de Abril num atoleiro. Deixou de haver afinidades ideológicas e as convicções foram substituídas por uma cronologia contínua, destinada ao enriquecimento de alguns, e que encobre, afinal, as ausências de carácter e as trapalhadas das mudanças de partido.

Os quatro presentes nos Prós e Contras são figuras com experiências próprias: Mário Soares, Anacoreta Correia, o reitor António Nóvoa e Leonor Beleza. Não percebi muito bem o que ali fazia aquela senhora. Mas isso não é relevante; talvez seja um equívoco. De todos, Soares foi o menos confuso em exprimir a sua actual cosmovisão política; Anacoreta, formal, cristão, exemplar, não ocultou a infinita tristeza que o percorre, ao discretear sobre o Portugal dos nossos dias; Nóvoa, talvez, o mais preocupado em denunciar o processo de mistificação em que vivemos; e Beleza, pessoalmente magoada com a justiça, contou umas historietas.

De uma forma ou de outra foram graciosamente simpáticos. Os estudantes, na plateia, actuaram como possibilistas e admitiram, no todo, que a cultura dominante se baseava na repressão e na comédia dramática. A seguir, e agilmente, fui dormir, imbuído de limpidíssima serenidade

Baptista Bastos no D.N.

O PS quer controlar tudo o que mexe no país. Socialista à frente do Conselho Nacional de Educação

Não é que o Conselho Nacional de Educação seja um órgão muito importante. É um órgão de consulta obrigatória que reúne representantes dos partidos políticos, associações de pais, sindicatos de professores, associações pedagógicas e peritos em educação. Até agora, era costume o presidente do CNE ser afecto a um partido da oposição. O Governo PS, fazendo jus à sua arrogância habitual, mandou os costumes às urtigas. O Parlamento vai aprovar hoje à tarde o nome de uma antiga deputada socialista e militante do PS para presidir ao Conselho Nacional de Educação: Ana Maria Bettencourt. Não ponho em causa a generosidade, competência e tolerância de Ana Maria Bettencourt que conheço há quase 30 anos e com quem, nos anos 80, desenvolvi um projecto de inovação educativa que o extinto GEP publicou em livro. Ana Maria Bettencourt é professora coordenadora na ESE do Instituo Politécnico de Setúbal, foi deputada do PS e conselheira para a educação do ex-presidente Jorge Sampaio. Nos últimos 4 anos, não a vi tomar posições críticas das políticas educativas de Maria de Lurdes Rodrigues. O que eu critico é esta ânsia do PS de tudo controlar no país. É mau para a democracia. Espero que os partidos da oposição estejam à altura das suas responsabilidades e votem contra a proposta.
A história
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